segunda-feira, 11 de janeiro de 2010
Para além do silêncio obsequioso
Outro dia acordei com uma angústia. Ao levantar percebi que não desejava dormir mais. A agonia só poderia ser do corpo faminto e após um banho para despertar o espírito para mais um dia de trabalho, providenciei um generoso desjejum. Com o corpo descansado, com a sensação agradável da limpeza do corpo, com a fome saciada percebi que o desconforto persistia. Me deparei com algo que fugia da simplicidade cotidiana. A inquietude instalada em minha alma transcendia as necessidades básicas e imediatas para a sobrevivência e conforto do meu corpo. Em uma situação assim o melhor que temos a fazer é colocar-se em questão. Isso só é possível àqueles que refletem sobre a existência. Pelo caminho da reflexão sugerida por Kant, para além da razão pura. Focar o olhar sobre as rotinas psicológicas com um esforço em que pesamos o próprio pensamento, seus mecanismos e motivações. Isso é colocar-se em questão.
E fato que a condição humana nos coloca em um brete em que compreendemos a vida por infindáveis símbolos, metáforas, crenças, religiões para compreender a própria condição humana. Despir-se das mitologias pode ser um gesto muito caro para muitos. Criamos labirintos existenciais que podem se transformar em prisões psicológicas. Para quem vive sob o signo da liberdade, tal situação pode provocar um profundo desconforto. Eis que me deparei com uma situação que repetia sistematicamente. Durante um período me foi solicitado silêncio para que minhas opiniões pessoais evitassem constrangimentos coletivos. Durante esse tempo, permaneci introspectivo. Minhas manifestações se davam por vias indiretas, com diversos interlocutores que “legitimavam” os posicionamentos que sempre fiz questão de sustentar. Neste labirinto que construí, permaneci andando em círculos abrindo caminhos para muitos que ao se depararem com suas conquistas me fechavam as portas. Ao compreender tal situação me veio a passagem de Zaratustra “já estou tão enfastiado da minha sabedoria, como a abelha quando acumula demasiado mel... Quisera dar e repartir até que os sábios tornassem a gozar da sua loucura e os pobres, da sua riqueza.”
Assim Zaratustra compreendeu que devia findar seu retiro espiritual de 10 anos e iniciar sua caminhada para a vida. Assim rompo o silencio obsequioso que ora me fora solicitado e como uma pulga adestrada já não ousava saltar para além dos limites que outrora havia me imposto. Minha alma estava angustiada pela necessidade de dar saltos mais altos e, para isso, deveria me desfazer de amarras psicológicas que edificaram as paredes do meu labirinto pessoal. Ao invés da busca do fio de Ariadne, o caminho é o salto sobre as paredes do labirinto que terá como conseqüência a destruição do próprio labirinto. O início da jornada se deu com Steven Pinker e sua obra Como a Mente Funciona. Não posso desprezar a contribuição de Richard Dawkins com o Gene Egoísta e seu ponto de vista em que nos qualifica como robôs desajeitados construídos pelos espirais imortais do DNA, desde os primeiros replicadores que surgiram em nosso planeta. Recomendo a leitura de ambos, mas não certifico paz de espírito com o olhar cientificista sobre nossa existência. Isso dependerá de cada leitor, pois cada ponto de vista é a vista de um ponto. O caminho é válido, no minimo você terá com clareza seu ponto de vista.
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