As
pessoas no trem, em sua grande maioria, eventualmente espiam para fora de si no
decorrer da viagem. Quando ocorre revelam no olhar um profundo
desespero. Uma espécie de agonia da existência. A maior parte do
tempo as pessoas ficam fixadas no aparelho celular. Os fones nos ouvidos
garantem o confinamento. Ou o teletransporte temporal por meio do
bate-papo, joguinho, redes sociais para escrever ao vento as emoções.
Nem
sempre as emoções correspondem com a realidade. Mas logo atribuímos uma
razão qualquer àquilo que não cabe em nossa compreensão. No trem, em plena
solidão em meio a multidão, um suspiro para oxigenar a fuga de seu desespero
existencial. Postagens de afeto lançam sentimentos bons ao vento em busca de
alguma conexão. Todos têm sono.
Dá pra
citar um exemplo, que pela memória congelei no tempo. Observei uma troca de
lugares no trem. Ao chegar em sua estação, a moça de meia idade
vagou um acento. O jovem que dormia de pé ao lado do banco que vagou lançou-se
e garantiu seu sono, agora sentado. Em frente a ele uma senhora ficou
visivelmente indignada. Porém, ao observar seus olhos percebi um
desconforto diferente. Olhei para o jovem e mostrei a ele a
situação. Imediatamente ele levantou para dar espaço à senhora enferma
que cambaleava no corredor do trem.
É evidente
que aquele jovem se portou de forma indelicada ao fazer uso de sua juventude e
rapidez para conquistar a vaga no acento. Não se trata de maldade. Isso ocorreu
pela forma como ele viaja no trem. Atomizado, desconectado da realidade e
imerso em um mundo virtual em que sublima suas angústias e torna confortável sua
estadia neste mundo psicológico. Isso impede que ele veja as outras
pessoas, embora esteja em meio a uma multidão. O que assusta é que as pessoas
do trem podem permanecer assim após o desembarque. Na vida toda, eventualmente
espiando para fora de si a realidade.
Charles Scholl
14 de setembro de 2015.
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