terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Estranhamentos à prática da democracia

Vivemos em um tempo de grandes mudanças políticas em que a democracia dá seus sinais de maturidade. Para a história política do Brasil as possibilidades de coligações e as normas eleitorais são tão distintas de suas tradições que soam como estranhas. As polarizações herdadas da guerra fria e suas adaptações tupiniquins se dissolvem em meio a outras lógicas políticas modernas de um pais democrático.

Para tornar mais evidente o contraste que vivemos neste tempo é fundamental recordar. Em dezembro de 1981, o senador Paulo Brossard ao chegar de sua viagem ao México, realizada no início daquele mês, denunciou o autoritarismo da Legislação eleitoral. “O projeto que “emporcalha” o País, concebido no Palácio do Planalto, prevê que os partidos só poderão concorrer se apresentarem chapas completas, com candidatos a governador, vice-governador, senador e suplentes, deputados federais e estaduais, prefeito, vice-prefeito e vereadores”. Ele reclamava ainda que as regras previam a anulação dos votos caso o eleitor escolher um único nome que seja de outro partido. Obviamente a manobra do Planalto, liderado pelo presidente Figueiredo, beneficiava o PDS. Com as regras o PP teve que fundir-se novamente com o PMDB.

Situações como essa forçavam a polarização entre os partidos dificultando a criação de novas identidades políticas ao tempo em que jogavam as propostas de governo para um segundo plano. Justamente no plano de governo é que se manifesta a virtude na política. Em 1998, acadêmicos analisavam e questionavam sobre a possibilidade da dispensa da virtude em um estado bem sucedido. Entre as reflexões, Catherin Colliot-Thélène da Fontenay Saint Cloud, chama a atenção que a democracia, segundo Montesquieu, tem como princípio a virtude. O fracasso da virtude, como lembra Montesquieu, tal como ocorreu na Inglaterra no século XVII comprometeu a democracia em seu país. Quando desaparece a virtude da república, a ambição se apodera daqueles cujo coração é capaz disso e a avareza de todos e que, em seguida, o Estado sendo tornado uma presa para todos, sua força reside apenas na potência de alguns indivíduos e na permissão de todos. Temos assim as bases do totalitarismo.

Habermas atribui a Hegel a inauguração da modernidade filosófica, pois foi Hegel quem pela primeira vez estabeleceu, na história do pensamento político, com toda a clareza, a distinção moderna entre Estado e sociedade civil. Obviamente não podemos dispensar o conceito de soberania de Bordin e de vontade geral de Russeau. Mesmo para a teoria Marxista, em seus desdobramentos práticos do Socialismo Real e a experiência do Leste Europeu, tais conceitos permaneceram impermeáveis. Dessas experiências que nos aproximamos quando dispensamos as possibilidades de unidade em torno de um projeto político, como denunciou Brossard em 81 no Brasil.
As amplas alianças em torno de um projeto político é a maturação prática da filosofia moderna aplicada. Diferentes correntes ideológicas firmam acordo e colocam em primeiro plano a virtude, ou melhor, o que acreditam ser o caminho mais adequado para o gerenciamento da coisa pública. Tal pensamento, que parece muito óbvio, encontra ainda forte rejeição entre operadores da política habituados com a lógica do bipolarismo mundial, que reinou no século passado durante a guerra fria. No novo contexto político que vivemos a sociedade civil organizada tem mais poderes sobre a composição do Estado que se dá pelos projetos políticos discutidos em suas bases partidárias. O Governo Lula nos mostra que a política se torna mais eficiente e virtuosa para a sociedade em composições mais amplas e plurais. O foco da atuação política não se limita a simples tomada do poder e sim no melhor caminho para o desenvolvimento social, político, econômico e ambiental de nossa civilização. Tal realidade bateu na porta dos milhares de eleitores no pleito deste ano. A decisão do voto, pelo prática adotada neste tempo, favorece o projeto que cada chapa tem para a cidade sem enfraquecer as legendas partidárias. Favorece a virtude e, portanto a democracia.

Charles Scholl
Diretor de Comunicação da Prefeitura de Esteio
falecomcharles@pop.com.br

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