domingo, 14 de dezembro de 2008

Mais uma derrota na legalização do aborto / 2007

Uma das resoluções da conferência nacional da saúde, realizada neste final de semana (17 e 18), em Brasília, retoma uma polêmica que persiste sem solução. A rejeição à resolução que recomenda a legalização das práticas abortivas no Sistema Único de Saúde, nos casos previstos em Lei, reforça uma polêmica em que os dogmas religiosos prevaleceram. O assunto chamou a atenção de ativistas de Direitos Humanos que lamentaram a posição tomada pelos conferencistas.

No Rio Grande do Sul, o representante da Ajuris para os assuntos de Direitos Humanos, Roberto Lorea, acredita que a questão do aborto pode ser comparada à polêmica do divórcio. O juiz titular da 2ª Vara de Família remonta os 20 anos de ditadura militar, em que o povo brasileiro viveu em regime de exceção. Com a redemocratização, na década de 80 e a aprovação da nova Constituição em 88, os Direitos Humanos passaram a ter mais popularidade. Apesar disso, o magistrado acredita que os Direitos Humanos ainda é uma especialização, enquanto que deveria ser um conhecimento a ser ofertado à população como matéria básica desde o ensino médio.

O mesmo debate foi feito pelos gaúchos no Palácio Farroupilha, em 98. A proposta apresentada pelo deputado da 49ª Legislatura, Marcos Rolim, do PT, tinha conteúdo semelhante e mesmo fim. Permitir que as mulheres pobres possam interromper a gravidez sem riscos a sua saúde. No decorrer do enfrentamento de posições ficou evidente que as mulheres de classe média, diante de uma gravidez indesejada, recorrem a clínicas para a realização da prática abortiva. Militantes do direito das mulheres defendem claramente que a mulher deve ter direito sobre seu corpo. Estudos científicos se debruçaram sobre o momento em que ocorre a geração do indivíduo, numa tentativa de dialogar com as posições dos religiosos que transformaram, dogmaticamente, o debate numa disputa da vida contra a morte.

Nesse caldo cultural, a situação das mulheres pobres perdeu importância para um jogo dialético que abstraiu o assunto em questão e imprimiu uma nova dinâmica no diálogo entre os oradores. Recentemente, em pesquisa divulgada pela revista Isto É, mostra que o comportamento sexual da família brasileira mudou muito quanto a perda da virgindade. Porém, a pesquisa mostra resistência quanto à questão do aborto. O projeto não foi aprovado, mas, segundo o proponente Marcos Rolim, o debate foi importante para desnudar para a sociedade um problema real que deve ser tratado. Segundo o juiz Roberto Lorea, não se trata de um posicionamento de um país majoritariamente católico, pois a posição adotada recentemente pelo México e Portugal em favor da legalização do aborto, mostra que é necessária a superação das resistências dogmáticas para a tomada de uma posição de vanguarda na legislação. O fato é que enquanto essa situação não é resolvida, as mulheres pobres têm recorrido a práticas abortivas que colocam em risco a sua saúde e fertilidade. Uma questão de injustiça social, em que os argumentos morais que condenam o aborto são abandonados quando os indivíduos, na sua particularidade, se deparam com a mesma prática. A única diferença é a situação econômica da mulher. Apesar da derrota que os conferencistas imprimiram ao tema, o Brasil deve encontrar outros meios para superar esse dogma.

Charles Scholl
falecomcharles@pop.com.br

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